sexta-feira, 27 de julho de 2012

"Rio+20: palco verde ou multicolorido?"

Por Marina Vianna Ferreira
Quem lê este artigo certamente já leu ou ouviu alguma coisa sobre o evento que ocupou ruas e espaços do Rio de Janeiro em junho deste ano, tamanho o alarde que foi feito para a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável. Mais conhecido como Rio+20, o encontro de pessoas do mundo todo faz referência à Rio 92, que há 20 anos também utilizava a cidade maravilhosa como palco para discussão de questões ambientais mundiais. Entre os dias 13 e 22, chefes de Estado e de Governo, ativistas ambientais, cientistas e representantes do mundo todo centraram se nos temas: “A economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza”, e a “Estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável”, para avaliar e repensar os erros e acertos a respeito de desenvolvimento sustentável, propondo novos acordos e reafirmando compromissos com o desenvolvimento e a proteção do planeta.
Não pensem que esse desafio ocorreu numa plenária gigante para milhares de pessoas em que todos os atores pudessem participar dos debates e decisões formais. Num senso estricto, a Rio+20 foi a reunião de preparação de um documento oficial, que teve a participação restrita a chefes de Estado e poucos representantes da sociedade civil organizada. Num lato senso, a Rio+20 foi a expressão de infindas diversidade e riqueza culturais que ocupava o território carioca numa dança dinâmica de cores, idiomas, povos, músicas, danças, falas, trajes, temas, materiais, experiências e movimentos, dos mais diferentes imagináveis. Centenas de eventos paralelos foram espaços de trocas dessa diversidade por todo o município. O maior deles, a Cúpula dos Povos foi um grande ambiente de trocas a céu aberto, este sim livre à participação de quem tivesse interesse, podendo ser um carioca desavisado correndo pelo Aterro do Flamengo ou uma marcha organizada lutando para ser ouvida. Marchas inclusive que não foram poucas, a cada momento era uma: contra o capitalismo, o colonialismo, o racismo, a homofobia, contra os agrotóxicos, os transgênicos, os incineradores, contra Belo Monte, as mudanças no código florestal, a emissão de carbono...
Não só as marchas enriqueceram os temas no Aterro, mas as exposições e apresentações de práticas para uma vida mais sustentável, com temas como a defesa de espaços públicos, de ciclistas, pedestres e transportes coletivos, a participação popular, as hortas comunitárias, economia solidária, a soberania alimentar, a agricultura familiar, o consumo consciente, matrizes energéticas verdadeiramente limpas, a garantia do território das populações tradicionais, a democratização dos meios de comunicação. E assim, se desenhava a infinidade de temas e práticas que era possível conhecer um pouco neste cenário que contrastava com a realidade das plenárias oficiais que ocorriam no Rio-Centro, na Barra da Tijuca. Como disse o sociólogo Boaventura de Souza Santos, “eram poucos os quilômetros que as separavam, mas havia um vasto oceano de distância política entre elas”. Alguns dos engravatados do Rio Centro visitavam o Aterro quase que como se estivessem visitando um zoológico, saltando aos olhos a dificuldade de se estabelecer um diálogo colaborativo de fato, que fizesse incorporar as vozes dos povos na papelada oficial da “Nações Unidas”.
O resultado disso tudo?
Para os mais críticos, nenhum. “Nenhum compromisso obrigatório para reduzir os gases do efeito estufa, nenhuma responsabilidade diferenciada para os países que mais têm poluído, nenhum fundo para o desenvolvimento sustentável, nenhum direito de acesso universal à saúde” (Boaventura de Souza Santos).
Para analistas e estudiosos, foi considerado insatisfatório. Minimamente, foi ressaltada a falta de foco do documento, tendo sido considerada como o preço de se buscar um consenso sobre um tema tão amplo entre tantos diferentes e contraditórios interesses.
Para o governo brasileiro, ironicamente satisfatório... A falta de resultados concretos dá espaço para que o palco seja armado onde realmente interessa. Finda a Rio+20, os telejornais se voltam para a crise econômica do Euro e o Congresso Nacional, se volta para seus projetos como Belo Monte, o Código Florestal, a construção de usinas hidrelétricas, os projetos de mineração, o império dos agrotóxicos, etc.
E o grande evento “verde” termina, velando mais uma vez uma gestão eficiente, democrática e sustentável do patrimônio ambiental, sob a bandeira da economia verde oferecendo cumplicidade aos “negócios verdes” e seus atores e sobrepondo as ideias multicoloridas de todos que estiveram no Rio.

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